Felizmente ainda em cartaz nos cinemas nacionais, graças ao Globo de Ouro de Melhor Atriz em Filmes de Drama vencido por Fernanda Torres, Ainda Estou Aqui é um filme baseado no livro autobiográfico de mesmo nome, escrito por Marcelo Rubens Paiva em 2015.
O livro, que aborda memórias diversas do autor, se dedica bastante a sua relação com sua mãe, Eunice Paiva, ao longo das décadas. E também, comenta bastante sobre a morte de seu pai, o ex-deputado federal Rubens Paiva, vítima da Ditadura Militar. Já o filme Ainda Estou Aqui se preocupa em mostrar quase especificamente o episódio da prisão e desparecimento de Rubens Paiva, porém sob o ponto de vista de Eunice, o que não deixa de também ser uma ótima escolha por Eunice ser desconhecida pela geração atual e merecer esta homenagem.
A história se inicia em 1971, apresenta brevemente Rubens (Selton Mello), Eunice (Fernanda Torres) e seus cinco filhos, e em pouco tempo já temos toda a tensão e repressão do regime militar afetando toda aquela família. Mesmo sem mostrar cenas de violência explícita, Ainda Estou Aqui consegue ser bastante tenso e dramático, e o roteiro consegue mostrar sem melodrama, mas de maneira comovente, Eunice sendo atacada tanto como esposa, mãe e cidadã livre.
O fato do filme mostrar basicamente cenas do cotidiano da família Paiva mostra de maneira assustadora que você não precisava estar nas ruas ou em um confronto armado para correr risco de vida. "O perigo está em todo lugar", o que é sentido por praticamente todos os personagens que aparecem em Ainda Estou Aqui, e isto é muito bem representado pelo diretor Walter Salles.
Muito bom tecnicamente, Ainda Estou Aqui é uma viagem no tempo. Desde as filmagens, que usaram câmeras de película compatíveis com as usadas naquela época (como por exemplo as Super-8), como figurinos, objetos, locações, trilha sonora... a preocupação com os detalhes foi enorme, e para as filmagens a antiga casa dos Paiva no Rio foi meio que "recriada". Ao assistir, o espectador se sente de fato como se estivesse vendo imagens dos anos 70.
O número de atores e atrizes em Ainda Estou Aqui é extensa, e para não me alongar, irei falar de apenas duas pessoas. Primeiro, claro... Fernanda Torres. Sem ter cenas de "grande drama", onde por exemplo ela pudesse gritar ou chorar, seu trabalho é comedido mas ainda assim excelente, transmitindo com perfeição as mais diversas emoções, da alegria à tristeza, do medo ao desânimo. E que bacana ver sua mãe Fernanda Montenegro no filme, mesmo que em uma breve aparição. Não só foi bem apropriado (já que as duas são parecidas fisicamente), como uma bela homenagem... além da Fernanda Mãe mandar muito bem como sempre.
Há uma frase muito famosa e verdadeira que é: "Um povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la.". Porém nos dias de hoje, vivemos em um mundo ainda pior, pois não somente o brasileiro não conhece mais seu passado, como temos nas redes sociais uma infinidade de informações falsas tentando REESCREVER o passado, da maneira mais mentirosa possível.
E é aí que Ainda Estou Aqui e o Cinema brasileiro acabaram fazendo algo essencial nos dias de hoje: nos relembrar de nossa história, nos ensinar e divulgar conteúdo honesto de modo claro e impactante. Com (até agora) cerca de 3,5 milhões de ingressos vendidos no Brasil, e sendo uma obra elogiadíssima em todo mundo, Ainda Estou Aqui é um exemplo do potencial do Cinema em documentar, em fazer sentir e refletir. Que este Ainda Estou Aqui continue tendo sucesso aqui e fora do país, e sirva de exemplo para mostrar que o Brasil sabe sim fazer filmes além dos de comediantes e cantores populares de baixa qualidade. Nota: 8,0
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