quinta-feira, 19 de junho de 2014

Crítica - O Homem Duplicado (2013)

Título: O Homem Duplicado ("Enemy", Canadá / Espanha, 2013)
Diretor: Denis Villeneuve
Atores principais: Jake Gyllenhaal, Mélanie Laurent, Sarah Gadon

Marcante filme de suspense com final difícil e polêmico

De título original Enemy ("Inimigo", em inglês), normalmente eu iria enlouquecer com a tradução dada aqui no Brasil para o novo filme do diretor canadense Denis Villeneuve: O Homem Duplicado. Entretanto, desta vez a tradução do título é bastante adequada, já que O Homem Duplicado é exatamente o nome do livro do escritor português José Saramago, publicado em 2002, no qual este filme é baseado.

Na trama, conhecemos o professor de história Adam Bell (Jake Gyllenhaal), que tem uma vida rotineira e desanimada, mas que um dia descobre assistindo um filme que, para sua grande surpresa, existe um ator exatamente idêntico a ele. Após pouco tempo, ele consegue se encontrar pessoalmente com o artista, de nome Anthony Claire (também vivido por Gyllenhaal). A experiência perturba ambos fortemente, e as consequências deste encontro vão dramaticamente se aumentando, chegando até a envolver suas mulheres, respectivamente Mary (Mélanie Laurent) e Helen (Sarah Gadon), e culminando em um surpreendente desfecho.

A história é boa, mas contada de maneira bem lenta, contemplativa. Tanto a fotografia (trazendo tons alaranjados no filme todo) quanto a trilha sonora são muito boas e transmitem com precisão o clima de melancolia e confusão dos personagens, além de, ser eficiente em trazer um forte clima de mistério para a película.

O roteiro e a montagem também agradam, já que requerem a atenção e a inteligência do espectador. Por exemplo, o filme mostra que tanto Adam quanto Anthony possuem medo de relacionamento, mas isto é feito de maneira sutil, implícita. Outro detalhe curioso: não há um único protagonista, as participações alternam entre Adam e Anthony em um ponto que só no final entendemos quem é quem em todas as cenas.

Sim, a frase acima entrega que o filme não é de tão fácil compreensão, mas falarei disto mais tarde, em seu desfecho.

Gostei bastante da atuação de Sarah Gadon, que não conhecia. Mas quem rouba a cena é Jake Gyllenhaal, provando definitivamente o quão bom e versátil ator ele é. Foi com prazer que pude concluir que os "tiques" apresentados por ele no filme Os Suspeitos (justamente o filme anterior do diretor Denis Villeneuve) eram mesmo de seu personagem (foram tão convincentes que eu pensei serem do próprio ator).

Tudo funciona bem em O Homem Duplicado... até chegarmos ao seu desfecho. O final é polêmico em vários níveis.

Primeiramente, a última cena termina de forma bastante abrupta, além de ser uma das coisas mais assustadoras que já vi no cinema até hoje. Sua conclusão "estranha" me lembra Donnie Darko (2001), que curiosamente também é estrelada por Jake. A conclusão (ou falta de uma) certamente deixará boa parte dos espectadores revoltados.

Mas... calma. Conforme é dito em forma de letreiro nos primeiros segundos do filme: "O caos é uma ordem ainda não decifrada". E de fato, é este o sentido do filme. Ele é um verdadeiro quebra-cabeças, que, ao assistido de novo, se torna mais claro. Há várias "pistas" espalhadas pelo filme todo, que ajudam a explicar a conclusão.

Para quem interessar, este vídeo (em inglês sem legendas), apresenta uma teoria para explicar o filme todo, a qual entendo ser correta: https://www.youtube.com/watch?v=v9AWkqRwd1I. Note que embora a explicação me convença, ela não me satisfaz em 100%. No meu último parágrafo deste texto explico em detalhes o que eu não gostei.

Independente da explicação para o final, um fato é claro: o desfecho é uma enorme alteração da obra de Saramago. No filme o final é aberto, um pouco dúbio, principalmente para o personagem Adam. Já no livro temos uma conclusão simples e direta; ela fecha a história, não dando margens a interpretações. E é nesta alteração do original que O Homem Duplicado tem ao mesmo tempo seu ponto fraco e forte: ao mesmo tempo que seus enigmas e explicações encantam por exigir mais do espectador, ao mesmo tempo não deixam a história 100% "redonda" (ver meu PS ao final).

Um bom filme de suspense e muito bem executado tecnicamente, O Homem Duplicado merece uma nota alta por ousar ser diferente. Filmes que não entregam tudo pro espectador estão cada vez mais raros, e consequentemente, chamam cada vez mais a minha atenção. Nota: 8,0

PS: conforme prometido acima, o que eu "não gostei do final" - não leiam este parágrafo antes de assistir o filme, é spoiler total! Entendo que o desfecho, por mais "redondo" e inteligente que seja, força um pouco a barra quanto ao relacionamento de Anthony com Helen. Oras, na última cena de Adam com sua mãe, ela praticamente entrega que Anthony e Adam são a mesma pessoa. Sendo este mesmo o caso, como Helen nunca soube que seu marido dava aulas? Como é possível estar casado com uma pessoa e não saber disto? Ainda mais quando o filme mostra que Helen conhece a mãe de seu esposo... elas nunca iriam falar sobre as atividades dele? Achei inverossímil. Curiosamente, no livro, Anthony e Adam são claramente dois personagens distintos, não há margem para esta tipo de interpretação.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Crítica - O Lobo Atrás da Porta (2013)

Título: O Lobo Atrás da Porta ("O Lobo Atrás da Porta", Brasil, 2013)
Diretor: Fernando Coimbra
Atores principais: Milhem Cortaz, Leandra Leal, Fabiula Nascimento, Juliano Cazarré

Tenso do início ao fim, um ótimo filme nacional

A grande maioria dos filmes brasileiros que chegam aos cinemas atuais ou são comédias românticas, ou comédias pastelão, ou ainda, sobre violência urbana. Felizmente temos alguns respiros desta mesmice, que é o caso deste ótimo O Lobo Atrás da Porta.

Escrito e dirigido por Fernando Coimbra (acostumado com curta-metragens, faz sua estréia em longas), o filme chamou a atenção em diversos festivais, embora não tenha conquistado nenhum dos prêmios mais importantes.

A história começa com a dona de casa Sylvia (Fabiula Nascimento) indo à polícia desesperada, dizendo que sua filha foi sequestrada. Quando seu marido, Bernardo (Milhem Cortaz) é convocado para depor, ele instantaneamente acusa sua amante, Rosa (Leandra Leal) de ser a responsável pelo ato.

É então que, conforme o trio conta a sua versão dos fatos para o delegado (Juliano Cazarré), entendemos através de flashbacks qual a real relação entre eles. Conforme as versões são contadas, o espectador (e o delegado) percebem as inconsistências, o que nos levam à novos flashbacks, agora "verdadeiros", e que causam reviravolta à trama.

As constantes surpresas a que somos submetidos são apenas um aspecto do ótimo roteiro de O Lobo Atrás da Porta. Desde a maneira com que a história é contada, até aos diálogos, tudo funciona meticulosamente bem no filme. O que inicialmente parece como uma inocente "baixaria" de marido-mulher-amante vai se tornando gradativamente, com maestria, algo cada vez mais sério, mais tenso, culminando no forte clímax, que é quando todas as peças do quebra-cabeça se encaixam.

O Lobo Atrás da Porta me lembra vagamente do estadunidense Closer (2004), que igualmente mostra o pior do ser humano em termos de relacionamentos. Mas o filme brasileiro é mais intimista, com muito mais paranoia do que sexo, e por isto tudo, levemente melhor.

Com boas atuações, principalmente a ótima interpretação da bela Leandra Leal, além do show de roteiro e montagem, O Lobo Atrás da Porta também agrada por sua trilha sonora. Quanto a sua fotografia, em muitos momentos as cenas aparecem levemente desfocadas. Embora eu ache provável que este "porém" seja consequência do tipo de câmera utilizado nas filmagens, existe uma possibilidade do problema ser na projeção do cinema que fui. Portanto, ao assistirem este filme nos cinemas, agradeço um comentário aqui em relação ao foco, para tirar minha dúvida.

Com pouquíssimos alívios cômicos, O Lobo Atrás da Porta é um filme bastante sério que vai do drama ao suspense - que infelizmente são temas raros no cinema brasileiro atual - e por isto mesmo chama a atenção por não se entregar ao caminho comum. O cinema nacional pode sim ser muito bom. Nota: 8,0

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Crítica - Malévola (2014)

Título: Malévola ("Maleficent", EUA / Reino Unido, 2014)
Diretor: Robert Stromberg
Atores principais: Angelina Jolie, Elle Fanning, Sharlto Copley

Um belo conto de fadas de belíssimo visual

A Disney nunca deixou de explorar um de seus principais nichos: as histórias de contos de fada. E é o que ela faz mais uma vez, agora com Malévola, porém em live action, que já é algo mais raro dentro deste gênero. Mais ainda, a história é uma reinvenção do conto da Bela Adormecida, clássica animação de 1959.

Desta vez, temos o conto sob o ponto de vista da vilã da história original, a bruxa Malévola (Angelina Jolie), que agora está rebatizada de "fada", sendo esta apenas uma das inúmeras alterações da obra original. De cara já ficamos sabendo que o Rei (Sharlito Copley) causou um grande mal à protagonista no passado, e portanto, a maldição do sono jogada na princesa Aurora (Elle Fanning) não se trata de simples maldade, mas sim de um isolado ato de vingança.

O roteiro é simplório, apesar de trazer uma boa trama principal e nos presentear com algumas surpresas. Portanto, o que realmente chama a atenção em Malévola é seu visual: belas paisagens, ótimo design, cores, efeitos especiais de primeira. Um deleite para os olhos.

E o filme traz um outro grande destaque, a encarnação de Malévola por Angelina Jolie. Pelo seu enorme carisma, pela ótima atuação, e exibindo uma indescritível beleza, o personagem é absolutamente marcante. Jolie já ficou imortalizada com Lara Croft. Mas acredito que sua Malévola se tornará ainda mais memorável.

Como conto de fada, Malévola é sem dúvida bom: possui algumas cenas belas e comoventes, e em suas melhores passagens se compara na qualidade às animações clássicas. O porém é que o filme possui alguns deslizes que poderiam ser evitados.

O primeiro deles é que definitivamente não se trata da história que já conhecíamos. O ideal seria que o roteiro contasse os mesmos fatos, porém sob outra ótica. Não é o que acontece: a trama é profundamente alterada, sendo uma das principais modificações o fato de Malévola ter acompanhado pessoalmente o crescimento de Aurora.

Este "crescimento", aliás, possui cenas em demasia e chega a ser repetitivo. Este tempo poderia ter sido aproveitado para, por exemplo, desenvolver os demais personagens. Sim, se o fato de Malévola roubar a cena é uma grande virtude, também se torna um defeito já que ninguém mais se desenvolve.

Mas o principal problema se encontra na batalha final de Malévola contra o exército do Rei. Neste momento, o filme passa a ser um reles filme de ação, com um ritmo acelerado totalmente destoante do que vimos até então. Fora isto, surgem várias cenas bastante clichê... e o pior: o filme cita tantas vezes ao longo da projeção quais são os poderes e fraquezas da protagonista que a luta final se torna previsível.

Malévola não deixa de ser o retrato de seu diretor, Robert Stromberg. É seu primeiro trabalho de direção, o que ajuda a explicar os defeitos acima. Ao mesmo tempo, Stromberg é um designer e especialista em efeitos especiais já consagrado em Holywood, cujos trabalhos incluem Avatar (2009), o mais recente Alice no País das Maravilhas (2010), e o Labirinto do Fauno (2006). Não é a toa, portanto, que o visual de Malévola seja tão admirável.

Sendo uma produção acima da média, mas com alguns problemas de roteiro, Malévola é no mínimo um conto de fadas bem divertido. Nota: 7,0.

PS: quem interpreta a versão da Aurora com 4 anos é a filha de Angelina, Vivienne Jolie-Pitt. Segundo a atriz, ela não gostaria de vê-la atuando tão cedo, mas foi uma questão de necessidade: a única criança que não chorava ao ver Jolie vestida de Malévola era sua própria filha.

Crítica - Em Ritmo de Fuga (2017)

Título :  Em Ritmo de Fuga ("Baby Driver", EUA / Reino Unido, 2017) Diretor : Edgar Wright Atores principais : Ansel Elgort, K...