sábado, 24 de fevereiro de 2024

Crítica - Pobres Criaturas (2023)

TítuloPobres Criaturas ("Poor Things", EUA / Hungria / Irlanda / Reino Unido, 2023)
Diretor: Yorgos Lanthimos
Atores principaisEmma Stone, Mark Ruffalo, Willem Dafoe, Ramy Youssef, Christopher Abbott, Kathryn Hunter, Jerrod Carmichael, Kathryn Hunter, Hanna Schygulla, Margaret Qualley, Suzy Bemba
Nota: 8,0

Emma Stone foi uma escolha perfeita para este Frankenstein atualizado e feminino

Depois de conseguir alguma fama e algumas indicações ao Oscar com seus filmes sempre estranhos, como O Lagosta (2015) e A Favorita (2018), parece que agora é mesmo a grande chance do diretor e roteirista grego Yorgos Lanthimos, já que este seu Pobres Criaturas está indicado a 11 estatuetas, e dentre elas a de Oscar de Melhor Filme.

Na história, temos a jovem Bella Baxter (Emma Stone), que aparentemente é trazida de volta à vida pelo cientista e médico cirurgião Dr. Godwin Baxter (Willem Dafoe). Porém, por motivos que entenderemos depois, é como sua mente estivesse vazia, e ela tivesse nascido pela primeira vez. Ingênua e muito curiosa, ela acaba fugindo com o mal intencionado advogado Duncan Wedderburn (Mark Ruffalo) em uma turnê pelo mundo, onde faz diversos aprendizados.

Lembrando que não temos aqui uma história original, e sim, a adaptação de um livro de mesmo nome, publicado pelo escritor escocês Alasdair Gray, em 1992. Como curiosidade, há várias diferenças entre o livro e este filme, e se tiver interessado nelas, leia o P.S. do final deste artigo. Há também uma considerável diferença estética... Yorgos Lanthimos retira a história original do século XIX "real" e o coloca em um mundo mais "fantasioso", estilizado... Isso garante a Pobres Criaturas belíssimas fotografias, figurinos e design de produção; não a toa o filme também recebeu indicação ao Oscar nestas três categorias.

Emma Stone e sua Bella Baxter são fascinantes. É difícil imaginar uma outra atriz que viveria tão bem este papel. Emma está incrível, e apenas acompanhar a jornada de descobrimento e empoderamento de sua Bella neste Pobres Criaturas já é um excelente e curioso entretenimento. E não é só ela que brilha na atuação. A lista de atores que participam da produção é grande e de boa qualidade. Mas destaco especialmente Mark Ruffalo e Willem Dafoe, que estão muito bem também.

Apesar de ser um ótimo filme, e certamente marcante, nem tudo é perfeito. Uma desvantagem é que os filmes de Yorgos Lanthimos são tão bizarros que acabam passando do ponto, e este efeito acaba por "diminuir" boa parte da reflexão ou questionamento social / moral presente na história, que aliás estão lá, é claro. Bella Baxter é sem dúvida uma formidável e destemida heroína contra o mundo do patriarcado. O excesso do "bizarro" infelizmente desvia um pouco do foco às críticas contra o machismo, e contra a soberba da alta sociedade, e está não só nos exageros dos personagens caricatos, mas até no modo que o diretor filma. Por exemplo, muitas das cenas são filmadas com ângulos estranhos ("tortos"), ou com efeito "olho de peixe"... e no começo, isto sempre tem relação com "confusão", "confinamento" ou "olhar de uma criança", e faz todo o sentido. Porém conforme o filme vai passando, estas cenas "estranhas" continuam a aparecer, mas já sem ter contexto nenhum, me parecendo ser um simples capricho estético.

Outra desvantagem é que em determinados momentos o filme acaba "amenizando" demais as situações, tornando-o bem inverossímil, especialmente durante o segmento em Paris. E reafirmo a existência desta "suavização" mesmo com a considerável quantidade de cenas de sexo (sim, corretamente o filme é apenas pra maiores de 18 anos). Tanto é verdade que ela existe, que há críticas de que o filme romantiza a prostituição (o que já neste caso, não concordo).

É muito interessante a conclusão que se pode fazer comparando esta adaptação de Pobres Criaturas com o livro de Frankenstein, sua óbvia inspiração. Aqui temos uma clara atualização / reinvenção da obra de Mary Shelley, inclusive atualizando sua narrativa com toda a tragédia e pessimismo que vivemos atualmente. E então temos uma curiosa inversão: no Frankenstein literário o mundo era mais belo, fervendo em idéias, mas o "monstro" era um infeliz pessimista; já em Pobres Criaturas é o mundo que é terrível, e o "monstro" é otimista, feminino e triunfante. E no meio de tantas notícias ruins atuais, talvez seja esse o exemplo e a heroína que precisemos. Nota: 8,0.




P.S.: Diferenças entre o filme e livro (fortes spoilers a partir daqui, leia por conta e risco).

São várias diferenças, porém irei focar nas duas principais. A primeira dela se refere ao narrador. No romance original, é como se ele fosse na verdade um livro de memórias do personagem de Max McCandles (Ramy Youssef), e ainda, em anexo às "memórias", um também fictício editor do livro encerra a obra anexando no final um texto com observações escritas por Bella, onde em geral ela conta que "tudo o que foi escrito é invenção de seu marido, que tinha imaginação muito fértil...". Já no filme, embora não tenhamos um narrador "de fato", na maioria do tempo a história é contada sob o ponto de vista de Bella.

A segunda grande mudança é o final das histórias. No livro, ao serem confrontados no casamento de Bella com McCandles pelo seu primeiro marido, ao contrário do filme, os homens acabam brigando, mas no final o antigo esposo vai embora e eles retomam o casamento. E, alguns meses depois, é McCandles quem morre, por ter saúde frágil. Então o livro se encerra abruptamente, dando espaço para as tais notas finais de Bella - que irão negar a história de seu marido - que citei no parágrafo anterior.

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