terça-feira, 4 de março de 2014

Crítica - Walt nos Bastidores de Mary Poppins (2013)

Título: Walt nos Bastidores de Mary Poppins ("Saving Mr. Banks", Austrália/EUA/Reino Unido, 2013)
Diretor: John Lee Hancock
Atores principais: Emma Thompson, Tom Hanks, Annie Rose Buckley, Colin Farrell, Ruth Wilson, Paul Giamatti

A fantasia da fantasia

Walt nos Bastidores de Mary Poppins, como o próprio título já diz, conta a história de todo o trabalho que Walt Disney (Tom Hanks) teve para convencer a escritora P. L. Travers (Emma Thompson) a liberar os direitos de sua criação, Mary Poppins para um filme. Mais ainda, há detalhes de como Travers influenciou no desenvolvimento do roteiro, através de seus inúmeros vetos e ajustes.

Mas além destes bastidores, há um outro filme rodando em paralelo: trata-se de cenas da infância da escritora. Sua versão mirim (Annie Rose Buckley) era absurdamente apegada ao pai alcoólatra (Colin Farrell). E é através desta história que entendemos porque Travers se tornou a pessoa rígida que é, e ao mesmo tempo, compreendemos que Mary Poppins é bastante baseada em personagens reais de sua sofrida infância.

As cenas do presente e passado vão se intercalando ao longo da projeção, e principalmente as cenas do passado são bastante monótonas. De qualquer forma são necessárias, pois só através delas é que conseguimos entender o comportamento tão "errático" da escritora.

Com uma história que não empolga, Walt nos Bastidores de Mary Poppins então se sustenta com as boas atuações de Tom Hanks e Emma Thompson. Totalmente opostos, o otimismo exagerado de Walt Disney duelando com a rabugice de P. L. Travers rende os melhores momentos do filme.

O resultado final é um filme de roteiro apenas razoavelmente interessante, mas com um bonito final. O problema é que a feliz história contada nas telas é bastante diferente da vida real.

Fora da fantasia, para começar, quando P. L. Travers vai a Los Angeles ela já havia cedido os direitos de seus livros à Disney, portanto, a premissa do filme já é, de cara, irreal. E depois que o contrato estava assinado, Walt pouco se importou em paparicar Travers. Ela negociava (e brigava) diretamente com os irmãos Sherman.

(Quem não assistiu o filme ainda, pule o parágrafo abaixo, que comenta sobre uma das cenas finais)

Outro ponto bastante discutível é o choro de P. L. Travers quando ela assiste seu filme pela primeira vez. Ao contrário de chorar de emoção como o filme mostra, ela havia chorado de raiva, devido a tantas distorções de sua obra original. Ao acabar a sessão, ela foi falar com Walt, pedindo a remoção de cenas inteiras, principalmente as com desenhos animados. Ao que Disney respondeu: "Pamela, that ship has sailed" (algo como, "Pamela, agora é tarde demais"), o que a deixou furiosa. Na vida real, P. L. Travers nunca perdoou a Disney pelo que fez com Mary Poppins. Mas décadas depois cedeu um pouco, dizendo ter se acostumado com o que aconteceu, que reconhecia que o filme era bom, apesar de não se tratar da Mary Poppins dela.

Com uma história apenas razoável, Walt nos Bastidores de Mary Poppins tem entre seus apelos a história de vida de Travers e a sua relação com Walt Disney. Infelizmente a segunda parte é pura ficção, o que enfraquece ainda mais o filme. Em filmes da Disney não dá para se esperar por realidade. Mas dá para se esperar o costumeiro final feliz. Nota: 6,0.

PS: a atuação de Tom Hanks como Walt Disney foi a primeira vez na história em que a Disney aceitou alguém representando seu criador.

segunda-feira, 3 de março de 2014

Oscar 2014 - Repeteco do ano anterior: o que importa é a mensagem


Saudações! Após a realização de mais um Oscar, o Cinema Vírgula comenta os principais pontos do evento. Foi um Oscar sem surpresas, e acertei todos os meus 6 palpites para vencedores.

Ser "previsível" não necessariamente indica que o Oscar foi justo. Na verdade, achei o Oscar justo no geral... mas a pisada de bola ficou para o fim, no prêmio de Melhor Filme.

Até aquele momento, tínhamos Gravidade com 7 Oscars - incluindo o de Melhor Diretor e o de Melhor Montagem - enquanto 12 Anos de Escravidão só tinha 2. É bastante "esquisito" um filme que vença por Diretor e Montagem não levar o melhor filme. Porém a vitória de 12 Anos de Escravidão mostra duas coisas:

1) Uma ficção científica vai sempre perder de um filme de época, não importando o quão bom ele seja.

2) Para a Academia atual, a única coisa que realmente importa é o filme ter uma mensagem. Ano passado, a mesma coisa aconteceu. Argo não era nem de longe o Melhor Filme, mas venceu pois passava a mensagem de apoio de Hollywood à política externa estadunidense. E agora, o melhor filme perdeu de novo. A mensagem anti-racismo valeu mais do que tudo. Um filme com apenas 3 Oscars foi eleito o melhor filme do ano (a mesma coisa que Argo). Chega até constranger. Mas como disse a apresentadora Ellen DeGeneres no começo da noite: "... ou 12 Anos de Escravidão vence como Melhor Filme, ou saímos daqui todos considerados como racistas".

De qualquer forma, 12 Anos de Escravidão também é um filme muito bom, e é muito mais justo que ele vença do que o superestimado Trapaça, por exemplo. E passar uma mensagem contra o racismo SEMPRE é bom. Aliás quanto a isto 12 Anos de Escravidão conseguiu algo ainda mais importante que o Oscar: o fato dele ser a partir de agora de exibição obrigatória nas escolas do EUA. Para finalizar, há outra coisa bem legal em 12 Anos ganhando: Brad Pitt enfim venceu seu primeiro Oscar. Como Produtor, já que como Ator a Academia ainda não cometeu a justiça de premiá-lo.

Os pontos altos da noite para mim foi a confirmação de Alfonso Cuarón como Melhor Diretor - primeiro latino-americano a receber este prêmio - e a vitória de Ela como Melhor Roteiro Original. Ela possui de longe o melhor roteiro do ano e fico feliz com a grata surpresa da Academia não ter escolhido o injustamente favorito Trapaça nesta categoria. Foi o primeiro Oscar do diretor/escritor Spike Jonze. Justíssimo.

E por falar em surpresas, acho que a única verdadeira surpresa da noite foi a derrota da Disney na categoria de Melhor Curta de Animação. O vencedor foi o desconhecido curta francês Mr Hublot. Mas a companhia do Sr. Walt não tem do que reclamar: Frozen faturou dois Oscars: o de Melhor Animação e o de Melhor Canção Original.

Da cerimônia como um todo, achei ela bem cansativa, foram 3h30 de duração. Tempo que seria muito menor se não fossem as inúmeras pausas para comerciais. A apresentadora Ellen DeGeneres não foi muito engraçada, mas pelo menos trouxe um pouco de modernidade à cerimônia. Seu "selfie" (a foto que ilustra este post) em tempo real bateu o recorde mundial de retweets, e marcou esta edição do Oscar.

Como resultado final, o Oscar 2014 foi melhor que o anterior. Seus indicados foram melhores, e a festa teve menos altos e baixos. Seu vencedor de Melhor Filme foi muito melhor do que o de 2013. Mas ainda assim, o melhor não venceu. E a Academia está se especializando em não premiar o melhor filme.

sábado, 1 de março de 2014

Oscar 2014 - Quem vai levar? Quem merece levar?


Mais um ano, mais um Oscar. E como sempre, o Cinema Vírgula dá seus palpites. Este ano mais uma vez temos 9 indicados a Oscar de Melhor Filme. Assisti todos os 9, apesar de não ter feito a crítica de Capitão Phillips, filme que dou nota 7,0. Abaixo segue a lista dos indicados a Melhor Filme, em ordem de minha preferência (o primeiro é o meu preferido, e assim sucessivamente). Entre parênteses, ao lado do nome, o número total de indicações que cada filme levou:

Gravidade (10)
Ela (5)
12 Anos de Escravidão (9)
O Lobo de Wall Street (5)
Nebraska (6)
Trapaça (10)
Clube de Compras Dallas (6)
Philomena (4)
Capitão Phillips (6)

Mais uma vez teremos um Oscar com as premiações bem divididas entre os indicados, sem nenhum grande favorito.

Mantendo a tradição, vamos tentar acertar os vencedores do Oscar 2014? Em 2012 eu acertei os 7 palpites que dei. Em 2013 eu acertei apenas 3 palpites de 7. Este ano, irei palpitar em 6 categorias:

Melhor Atriz Coadjuvante
- Quem vai levar: Lupita Nyong'o (12 Anos de Escravidão)
- Em quem eu votaria: Lupita Nyong'o (12 Anos de Escravidão)
- Comentários: Lupita Nyong'o é a grande favorita e atuou muito bem. De qualquer forma Jennifer Lawrence (Trapaça) corre por fora já que é idolatrada pela Academia.

Melhor Atriz
- Quem vai levar: Cate Blanchett (Blue Jasmine)
- Em quem eu votaria: Cate Blanchett (Blue Jasmine)
- Comentários: Das cinco indicadas: Amy Adams (Trapaça), Cate Blanchett (Blue Jasmine), Sandra Bullock (Gravidade), Judi Dench (Philomena) e Meryl Streep (Álbum de Família) só não vi a atuação da Meryl. E se o Oscar fosse para qualquer uma das outras quatro, não seria injusto. Mas Cate Blanchett prova mais uma vez sua grande versatilidade e leva minha torcida. Se a competente australiana não levar, aposto minhas fichar em Amy Adams, a única das cinco que ainda não levou a sonhada estatueta pra casa.

Melhor Ator Coadjuvante
- Quem vai levar: Jared Leto (Clube de Compras Dallas)
- Em quem eu votaria: qualquer um menos Jonah Hill (O Lobo de Wall Street) e Bradley Cooper (Trapaça)
- Comentários: Ao contrário da forte categoria anterior, como Ator Coadjuvante nenhuma atuação empolga. Jared Leto deve levar devido sua transformação física, que a Academia adora. Torço o nariz para Jonah Hill e Bradley Cooper, para mim ambos com atuações superestimadas, não deveriam nem ter sido indicados.

Melhor Ator
- Quem vai levar: Matthew McConaughey (Dallas Buyers Club)
- Em quem eu votaria: Leonardo DiCaprio (O Lobo de Wall Street)
- Comentários: Matthew McConaughey é o grande favorito, e também devido a sua transformação física. Não me incomodo se ele vencer pois evoluiu muito como ator nos últimos anos. Por outro lado, Leonardo DiCaprio leva minha simpatia. Ele já mostrou diversas vezes ser um grande ator mas nunca venceu um Oscar. E este ano ele teve duas atuações marcantes: tanto em O Lobo de Wall Street, onde foi indicado, quanto também em O Grande Gatsby, que apenas recebeu 2 indicações técnicas.

Melhor Diretor
- Quem vai levar: Alfonso Cuarón (Gravidade)
- Em quem eu votaria: Alfonso Cuarón (Gravidade)
- Comentários: Gravidade é genial e o mexicano Cuarón é genial. Está mais do que na hora do diretor ter o reconhecimento de seu brilhante trabalho. Por outro lado, Steve McQueen (12 Anos de Escravidão) é outro nome igualmente forte, e se vencer, será o primeiro diretor negro a receber o prêmio.

Melhor Filme
- Quem vai levar: 12 Anos de Escravidão
- Em quem eu votaria: Gravidade
- Comentários: Como vocês perceberam já no começo do meu texto, Gravidade é meu grande preferido, um marco técnico dos cinemas, e uma grande ficção científica. Seu "problema" (pelo menos aos olhos da Academia) é justamente ser uma ficção científica, gênero que jamais foi agraciado com um Oscar de Melhor Filme em toda a história. Queria que 2014 fosse o ano em que este preconceito acabasse.... mas, duvido. Trapaça corre por fora e tem chances. Embora seja um bom filme, é bem inferior a Gravidade e a 12 Anos de Escravidão. Mas por ser um filme "de atores" que agrada a todos, sem ter rejeição, não podemos descartá-lo.
  
Não percam!
O Oscar será amanhã, domingo dia 02 de Março, e terá transmissão a partir das 20h30 pelo canal TNT. A TV aberta ficará de fora, já que a dona Globo optou por transmitir o Carnaval e não fará transmissão ao vivo.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Crítica – RoboCop (2014)

Título: RoboCop ("RoboCop", EUA, 2014)
Diretor: José Padilha
Atores principais: Joel Kinnaman, Gary Oldman, Michael Keaton, Abbie Cornish, Jackie Earle Haley, Samuel L. Jackson

Ótimas idéias, não tão bem executadas

A história você já conhece: Alex Murphy (Joel Kinnaman) é um policial de Detroit que é seriamente ferido por bandidos, sendo as chances de sua sobrevivência quase nulas. A solução? Ser inserido em um corpo mecânico graças a um experimento da OmniCorp, uma gigantesca multinacional.

A premissa principal é a mesma, e a discussão “seria RoboCop máquina ou homem?” é tão boa e tão competente quanto a do filme original, de 1987. Porém as semelhanças entre a obra do brasileiro José Padilha e a do holandês Paul Verhoeven param por aí: o novo RoboCop é bem diferente de seu antecessor.

O RoboCop de Padilha é maior: estamos falando de política internacional. Se em 1987 a OmniCorp pensava em conquistar Detroit, aqui a empresa tenta conquistar os Estados Unidos. Segundo a história, robôs militares da OmniCorp “pacificam” outros povos ao redor do mundo, mas não conseguem vender seus robôs dentro dos EUA, pois existe uma lei que impede que máquinas militares operem no país. São bilhões de dólares que deixam de serem lucrados pela companhia. E é assim então que surge a idéia de RoboCop: fazer um “homem dentro da máquina” é a maneira que a OmniCorp vê para burlar a lei e colocar “máquinas” nas ruas.

A idéia é ótima, e muito bem explorada ao longo do filme. Porém fora as ideias centrais, há muita coisa ruim neste novo RoboCop.

A começar pelo elenco: como presidente da OmniCorp, a atuação de Michael Keaton é catastrófica. Canastrão ao extremo, parece estar o tempo todo declamando o roteiro. Uma das piores atuações que já vi. E tudo ao seu redor é ruim. As “reuniões maléficas para dominar o mundo” são constantes, clichês, e quebram totalmente o ritmo do filme.

RoboCop também mudou. Se por um lado é genial ver ele utilizando a invasiva tecnologia de câmeras e redes ao seu favor, por outro ele ganha status de “super-homem”, sendo extremamente superior aos seus inimigos, mesmo mecânicos, o que é um grande exagero. Para piorar, a nova armadura preta não convence sempre. Em alguns momentos ele parece um robô, mas em outros, parece ser apenas um cara dentro de uma armadura.

As cenas de ação também são ruins: são sempre com visão de primeira pessoa, parecendo um jogo de videogame. As cenas são muito rápidas e escuras, você simplesmente não consegue perceber de verdade o que está acontecendo. Você apenas ouve os tiros, vê os vilões no chão e imagina o que aconteceu...

Falta também a RoboCop um pouco de foco... o filme trata ao mesmo tempo de política internacional, corrupção na polícia, manipulação da mídia, questionamento da humanidade de RoboCop, grandes corporações, vingança, emprego da tecnologia ... ufa! Tantos assuntos diferentes abordados ao mesmo tempo acabam deixando o espectador (e até o próprio personagem) um pouco confusos. Esta variedade é ao mesmo tempo um grande defeito e uma grande virtude.

Fechando a parte de personagens e atuações, Gary Oldman atua bem, mas seu personagem Dr. Norton é irregular e contraditório. Já a esposa de Alex (interpretada pela bela Abbie Cornish), ao contrário do filme original, aqui encontra seu espaço.

Para fazer seu filme, Padilha trouxe mais compatriotas para trabalhar com ele: Lula Carvalho (Fotografia), Daniel Rezende (Edição) e Pedro Bromfman (Trilha sonora), cujas participações para mim foram respectivamente: boa, razoável e ruim.

Em sua estreia em Hollwood o diretor José Padilha entrega no final das contas uma obra com tantos altos e baixos que na média acaba se tornando um filme mediano. Uma pena que novidades tão boas como as que ele trouxe se percam em meio de tantos problemas de execução.

Me pergunto o quanto destes problemas são culpa do brasileiro ou inferência dos produtores. Boatos da interferência dos mesmos foram muitos e certamente ocorreram. Por exemplo, eles fixaram a censura em PG-13 (maiores de treze anos), limitando nosso diretor. Mas digo isto: o final do filme surpreende ao trazer uma forte crítica, não só ao governo dos EUA, mas ao Estados Unidos como um todo. Se os produtores deixaram uma crítica desta passar, talvez nem tudo seja culpa deles. Nota: 6,0.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Crítica – 12 Anos de Escravidão (2013)

Título: 12 Anos de Escravidão ("12 years a slave", EUA / Reino Unido, 2013)
Diretor: Steve McQueen
Atores principais: Chiwetel Ejiofor, Michael Fassbender, Lupita Nyong'o
Trailerhttp://www.youtube.com/watch?v=xSL_sCHDsHc
Nota: 8,0

A boa história de sempre contada de maneira um pouco diferente

Quando bem feito, não há como não se comover, se revoltar, se envolver com filmes de escravidão. Seus oprimidos personagens ganham nossa simpatia e nos emocionam. E isto não é diferente em 12 Anos de Escravidão, que é um filme muito bem feito.

Entretanto, após mais de um século de cinema, filmes sobre escravismo não faltam. É muito difícil fazer um filme sobre o tema sem mostrar “mais do mesmo”. Felizmente, 12 Anos de Escravidão consegue um considerável sucesso em ser diferente ao fugir de alguns clichês e de utilizar bem de alguns recursos cinematográficos.

Na história baseada em fatos reais, estamos nos EUA dos anos 1840, e Solomon Northup (Chiwetel Ejiofor) é um homem livre negro do estado de Nova York. Enganado e sequestrado eu uma viagem, ele é levado ao sul do país, onde é vendido como escravo e passa por diversos “senhores”.

Há vários clichês em 12 Anos de Escravidão – o que enfraquece o filme - como por exemplo, o escravo sendo obrigado a chicotear outro, o motim dentro do navio negreiro, a “senhora” má; e o “senhor” que se apaixona pela escrava, especificamente neste caso, o cruel branco Edwin Epps (Michael Fassbender) e a escrava Patsey (Lupita Nyong'o).

Porém 12 Anos de Escravidão já começa a  ser diferente da maneira em que se conta a história. Por exemplo, com uma bela fotografia, o filme que se passa na zona rural resiste a tentação de trazer cenas “épicas” com paisagens e cria um clima muito mais intimista, mostrando sempre imagens a cerca de 3 a 5 metros dos atores. A trilha sonora também foge do convencional, por exemplo trazendo em alguns momentos de tensão uma trilha incidental que lembra mais um filme de suspense ou terror. E tudo isto funciona muito bem.

E há também alguns elementos novos: por ser um homem livre e culto, Solomon é bastante inteligente e versátil. E mesmo com ele tentando sempre se comportar para não ser punido, ele simplesmente não consegue disfarçar que é “diferente”, o que lhe causa vários conflitos interessantes ao longo da história.

Somando a estas gratas surpresas, o filme flerta com algumas curtas cenas marcantes, como a do encontro dos escravos negros com índios, ou ainda, como a cena de close onde, tomado por extremo desespero, Solomon olha por fração de segundos no olho do espectador.

12 Anos de Escravidão foi indicado a 9 Oscars e é um dos favoritos da premiação: Melhor Filme, Melhor Diretor (Steve McQueen), Melhor Ator (Chiwetel Ejiofor), Melhor Ator Coadjuvante (Michael Fassbender), Melhor Atriz Coadjuvante (Lupita Nyong'o), Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Figurino, Melhor Montagem, Melhor Design de Produção.

Da parte das atuações, Chiwetel Ejiofor e Michael Fassbender estão bem, mas não se destacam tanto. Lupita Nyong'o é quem brilha mais, porém ela aparece pouco durante o filme.

Com uma boa história, e que consegue trazer alguns elementos novos mesmo em um tema tão batido, 12 Anos de Escravidão consegue comover sem ser apelativo, ou melhor dizendo, sem ser piegas. Méritos para a boa direção de Steve McQueen, que indicado ao Oscar, tem a chance de ser o primeiro diretor negro a levar a estatueta. Nota: 8,0.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Crítica - Clube de Compras Dallas (2013)

TítuloClube de Compras Dallas ("Dallas Buyers Club", EUA, 2013)
Diretor: Jean-Marc Vallée
Atores principais: Matthew McConaughey, Jennifer Garner, Jared Leto

Filme bom, sóbrio, sobre o início da AIDS


O ano é 1985: o início da AIDS. Época em que se acreditava que a doença era transmitida por um simples contato, e mais ainda, que só era contraída por usuários de drogas injetáveis e homossexuais.

Baseado em uma história real, é neste contexto que o caubói texano Ron Woodroof (Matthew McConaughey) - homofóbico machão comedor de mulheres - descobre estar contaminado pelo vírus HIV.

Então vemos a luta desesperada de Woodroof pela obtenção de remédios. E o AZT, única droga disponível mas só em caráter experimental, não lhe é fornecido. Desesperado, ele parte para o México, onde descobre medicamentos alternativos muito menos danosos ao organismo que o próprio AZT.

Fazendo uma parceria com o travesti e também soropositivo Rayon (Jared Leto), os dois começam a importar os remédios mexicanos para os EUA, e fundam o "Clube de Compras Dallas", onde os sócios do clube (que pagam US$ 400 mensais) podem usufruir destes medicamentos.

É então que o filme entra na sua parte "política", com o FDA perseguindo Woodroof e seu empreendimento por ser ilegal e, principalmente, por se mostrar mais eficiente que o AZT, a menina dos olhos da indústria farmacêutica estadunidense.

Apesar de tocar em assuntos fortes, como o preconceito contra os aidéticos e os homossexuais, ou como a ganância do FDA e das grandes empresas farmacêuticas, o filme em nenhum momento choca. Tudo é passado com enorme sobriedade (reforçada pela quase ausência de trilha sonora).

Esta sobriedade se reflete em um filme com pouca emoção. Somado ao fato do roteiro não possuir nenhum grande atrativo, a soma destes fatores faz que Clube de Compras Dallas, que é um filme bem redondo e bem feito não levar uma nota tão alta.

Clube de Compras Dallas foi indicado a seis Oscar: Melhor Filme, Melhor Ator (Matthew McConaughey), Melhor Ator Coadjuvante (Jared Leto), Melhor Roteiro Original, Melhor Montagem e Melhor Maquiagem. 

Para Melhor Ator, Matthew McConaughey sem dúvida impressiona pela transformação física. Magérrimo, parecendo mesmo um doente terminal, ele também atua bem, embora não seja excepcional. Mais ainda, seu sotaque texano vai e volta ao longo da projeção.

De todas as indicações, Jared Leto como Ator Coadjuvante é a indicação mais forte do filme. Ele convence como travesti e atua muito bem. Além disto, chegou a emagrecer ainda mais que McConaughey, mas curiosamente sua magreza não é tão chocante. O único problema que vejo em um favoritismo em Leto é que ele não aparece tanto tempo assim na tela.

Já nas demais categorias, onde Clube de Compras Dallas certamente possui seus méritos, suas indicações para Oscar me parecem exageradas.

Clube de Compras Dallas é um bom filme que vale a pena conhecer, como registro histórico do início da AIDS, e por todas as discussões de preconceito e dinheiro envolvidas. Nota: 7,0.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Crítica - Nebraska (2013)

Título: Nebraska ("Nebraska", EUA, 2013)
Diretor: Alexander Payne
Atores principais: Bruce Dern, Will Forte, June Squibb, Stacy Keach
Trailerhttp://www.youtube.com/watch?v=_I8l5_29iwk
Nota: 8,0

Mais um belo road movie de Alexander Payne

O diretor estadunidense Alexander Payne não tem vergonha em repetir o gênero no qual é muito bom: um road movie contando uma jornada incomum de um homem idoso (ou de meia idade) em busca de mudança. Foi assim em As Confissões de Schmidt (2002), em Sideways - Entre Umas e Outras (2004), e agora com Nebraska. Uma pequena diferença é que desta vez, ao contrário de seus filmes anteriores, ele não é também o roteirista.

Na história, Woody Grant (Bruce Dern), bem idoso, recebe uma carta-propaganda de assinatura de revistas que oferece um prêmio de US$ 1 milhão. E acreditando no anúncio, ele resolve ir a Nebraska (que fica a mais de 1000km de distância) buscar o prêmio. Incapaz de dirigir um carro, e como sua esposa  Kate (June Squibb) não quer levá-lo, Woody decide ir a pé. O que claro, não dá certo.

Comovido com a história do pai, é então que o filho mais novo David (Will Forte) resolve levar Woody a Nebraska, mesmo duvidando um pouco de sua lucidez. Pai e filho se envolvem em uma longa viagem, com parada obrigatória em Hawthorne, cidade onde Woody passou a juventude e reencontrará familiares e amigos.

Apesar de se passar nos dias atuais, Nebraska foi rodado em preto e branco, o que reforça não somente o tom melancólico do filme, como também nos relembra constantemente do passado. Não a toa a grande maioria dos personagens do filme são idosos, tudo remota o que já foi.

O casal Woody Grant e Kate possui personalidades bem distintas, e ambos certamente podem ser identificáveis com os velhinhos que você conhece na vida real. Woody é extremamente teimoso, de raciocínio lento e poucas palavras. Já Kate é mandona, faladeira, sempre julgando mal os conhecidos. E claro, ambos possuem aquele raciocínio diferenciado que só os idosos tem.

Este “jeitão” dos velhinhos proporciona ótimas piadas ao longo do filme. Mas o tom do filme não é de humor. Os personagens são complexos, com virtudes e defeitos, e a difícil relação entre todos eles torna a história bastante interessante e com vários conflitos.

Nebraska foi indicado a 6 Oscars: Melhor Filme, Melhor Diretor (Alexander Payne), Melhor Ator (Bruce Dern), Melhor Atriz Coadjuvante (June Squibb), Melhor Roteiro Original e Melhor Fotografia. Em minha opinião, todas as indicações são aceitáveis, mas ao mesmo tempo não acho que o filme mereça ser o vencedor em qualquer uma das categorias.

Lento, com boa trilha sonora (embora repetitiva), bom roteiro, e com uma história bonita e humana, Nebraska é outro filme muito bom destacado este ano pela Academia. Nota: 8,0


sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Crítica - Philomena (2013)

TítuloPhilomena ("Philomena", EUA / França / Reino Unido, 2013)
Diretor: Stephen Frears
Atores principais: Judi Dench, Steve Coogan
Força do filme reside em ser uma história real

Quatro indicações a Oscar (incluindo a de Melhor Filme), vencedor de melhor filme em Veneza, segundo lugar em Toronto. Bastante elogiado internacionalmente e vendido como comédia. Mas fatos podem ser um pouco enganosos. Philomena é bom, mas não tanto assim. E está longe de ser uma comédia.

Na história, baseada em fatos reais Philomena Lee (Judi Dench) era uma garota irlandesa que vivia em um internato de freiras. E cometeu um erro: em um romance relâmpago, engravidou. Punida pelas Irmãs, seu filho logo foi dado à adoção, e desde então Philomena nunca mais o encontrou embora sempre procurasse por ele.

Cinquenta anos depois, temos Martin Sixsmith (Steve Coogan – que também é roteirista e produtor do filme), jornalista recém demitido, que fica sabendo da história de Philomena e, em troca de poder contar sua história, resolve ajudar a velhinha a encontrar seu filho.

Viajando juntos, temos uma história de busca consideravelmente interessante dada a presença de algumas gratas reviravoltas. O filme não é clichê. Por outro lado, um detalhe na montagem me incomodou bastante em Philomena: o uso de flashbacks. Intrusivos, eles estão sempre desnecessários, já que tudo o que vemos neles também são mostrados no tempo presente.

Philomena é a típica “velhinha caipira inocente”, e é explorando suas reações perante as “modernidades” que temos os momentos cômicos do filme. Embora boas piadas, o filme não nos permite rir, já que a situação de Philomena é muito triste.

A situação de Philomena é causada, em grande parte, pelos defeitos do Catolicismo antigo: punições cruéis e exploração da culpa. E se as críticas religiosas são parte fundamental do filme, não deixa de ser irônico constatar que todo o sofrimento que as freiras lhe impuseram tornaram Philomena uma pessoa com muita fé e muito melhor que as irmãs que a educaram.

A atuação de Judi Dench, indicada a Oscar de Melhor Atriz é muito boa, mas nada espetacular. Quanto ao roteiro, também indicado ao Oscar, os adjetivos são os mesmos.

Com uma história tocante, mas sem grandes momentos, talvez a grande força de Philomena – para torná-lo tão elogiado pela crítica – reside na triste constatação de se tratar de uma história real. Nota: 7,0

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Crítica - Ela (2013)

TítuloEla ("Her", EUA, 2013)
Diretor: Spike Jonze
Atores principais: Joaquin Phoenix, Rooney Mara, Amy Adams, Scarlett Johansson 

Uma obra completa sobre as dificuldades do amar

Em sua superfície, Ela até parece ficção científica. Ou um romance pastelão. A história: Theodore Twombly (Joaquin Phoenix), um escritor que acabou de se separar de sua esposa (Rooney Mara) compra um inovador programa de computador, intitulado “SO1”, que promete ser o suprassumo da inteligência artificial. O programa possui uma personalidade própria, que se intitula Samantha (a voz de Scarlett Johansson), e passa a interagir com Theodore 24hs por dia. E não demora muito para eles se apaixonarem.

Mas Ela não é nenhum nem outro. Ela é um drama, que percorre por todos os sentimentos que passamos em termos de relacionamentos: do não ter relacionamento (solidão), ao extremo de ter um relacionamento feliz.

A premissa é que por Samantha não ser real, o relacionamento possuirá limitações e problemas. Porém se esta premissa é “óbvia”, o desdobramento da história não tem nada de clichê. Ao invés de demonstrar as limitações “físicas”, Ela nos traz uma viagem pelos sentimentos dos personagens:

Theodore, solitário e romântico, viu um casamento inicialmente muito feliz se desmoronar aos poucos. E mesmo se relacionando com a “personalidade perfeita”, não consegue ser totalmente feliz. E acompanhamos todo seu sofrimento, suas dúvidas, sua paixão. Com a câmera focando o tempo todo em Theodore em planos fechados, e com um tom quase monocromático de marrom, nos sentimos tão deprimidos e separados do mundo exterior como ele.

Já de Samantha acompanhamos todo seu aprendizado emocional. Extremamente “humana”, compartilhamos com ela a emoção de se ter o primeiro amigo, de se ter o primeiro amor, e de ser uma estranha no mundo dos humanos.

O filme ainda permite um tempinho para mostrar outro tipo de amor: o entre amigos, que Theodore possui em relação a sua amiga Amy (Amy Adams), que também tem suas próprias desilusões amorosas.

Ela foi indicado a cinco Oscar: Melhor Filme, Melhor Roteiro Original, Melhor Canção Original, Melhor Trilha Sonora e Melhor Design de Produção.

A trilha sonora é de fato muito boa e adequada, nos transmitindo com exatidão a tristeza do personagem principal. Mas ao mesmo tempo, a trilha deixa de ser essencial, já que imagens, atuações e diálogos são tão bons que conseguem transmitir o sentimento de melancolia por si só.

Joaquin Phoenix atua muito bem, como sempre. Uma pena que não tenha levado nenhuma indicação. E Scarlett Johansson, quem diria... apesar de ser apenas uma voz, transmite sua emoção com maestria. Quem disse que ela não consegue ser boa atriz?

E quanto ao roteiro, ele é excepcional. Dos diálogos às reviravoltas constantes, é até o momento em que escrevo estas palavras meu preferido ao Oscar nesta categoria. Spike Jonze, o diretor, foi também o roteirista. Palmas para ele.

Ela tem um estilo bem diferente da correria que vemos nos filmes atuais. É o que popularmente chamamos de “filme cult”. Ela é um filme lento, parado, contemplativo, melancólico. E brilhante. Nota: 9,0

Crítica - Indiana Jones e a Relíquia do Destino (2023)

Título : Indiana Jones e a Relíquia do Destino ("Indiana Jones and the Dial of Destiny", EUA, 2023) Diretor : James Mangold Atores...